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Vantablack x Black 2.0: a briga pelo material preto mais preto do mundo

Se você acha que preto é ausência de todas as cores, ou melhor, uma ‘cor sem cor’, não sabe o tamanho da batalha pelo título do preto mais preto do mundo. Tudo começou com o lançamento do Vantablack, um material desenvolvido pela empresa britânica Surrey Nano Systems que concedeu os direitos exclusivos de uso ao artista plástico Anish Kapoor.

Nascido em 12 de março de 1954, em Bombaim, na Índia, Anish Kapoor é um escultor que ganhou notoriedade quando mudou-se para Londres no início da década de 1970 para estudar arte, primeiro na Faculdade de Arte de Hornsey e depois na Escola de Arte e Design de Chelsea.

Anish Kapoor ‘Untitled’ (2006-07). Escultura usando Vantablack – criada para a Galeria de Arte de Queensland (Imagem: Anish Kapoor);

Essa exclusividade/monopólio deixou muitos artistas enfurecidos, que queriam experimentar, usar o pigmento em suas criações, em especial, o britânico Stuart Semple, que comprou uma briga direta com Kapoor.

Semple decidiu então criar suas próprias cores exclusivas, dando vida ao world’s pinkest pink (o pink mais pink do mundo), greenest green (o verde mais verde), Yellowest Yellow (amarelo super amarelo), Loveliest Blue” (azul amável), e pra duelar diretamente com Kapoor, a sua versão ao “Vantablack”, chamada Black 2.0, que pode ser adquirida no site de Stuart e comprado por qualquer pessoa – apenas com uma pequena ressalva:

“Ao adicionar este produto ao seu carrinho, você confirma que você não é Anish Kapoor, você não está de forma alguma afiliado a Anish Kapoor, você não está comprando esse item em nome de Anish Kapoor ou um associado de Anish Kapoor. Para seu melhor conhecimento, informações e crenças, esta pintura não tornará nada nas mãos de Anish Kapoor”.

World’s pinkest pink;

Mesmo com um forte esquema para que suas cores não chegassem as mãos de Kapoor, isso acabou não acontecendo. O artista passou por cima das restrições e conseguiu comprar umas das tintas criadas por Semple, e ainda postou uma mensagem debochada e provocativa em seu Instagram, o que deixou Semple desapontado como no depoimento abaixo:

Estamos todos extremamente desapontados ao ver que Anish Kapoor adquiriu ilegalmente o ‘world’s pinkest pink’. Ele entrou nessa guerra pela pintura com um gesto que pode ser mal interpretado. Não só ele se recusou a compartilhar o preto (Vantablack), como ele agora roubou nosso ‘world’s pinkest pink’. Tenho a certeza de que chegaremos em quem comprou isso em nome de Anish Kapoor e quebrou seu acordo contratual. Instruiremos nossos advogados a tomarem as medidas apropriadas contra tais violações. Estamos satisfeitos por notar que ele não conseguiu colocar as mãos no ‘Glitteriest Glitter’ (glitter mais glitter do mundo) – ainda assim – pedimos aos compradores que não compartilhem o produto com a Kapoor ou seus associados”. 

Anish Kapoor “Cloud Gate” (2006), após o artista cobrir a escultura com Vantablack (imagem: Cidade de Chicago);

Brigas à parte, você deve estar se perguntando:

O que esse Vantablack tem de tão especial?

Segundo a empresa criadora, a Surrey Nanosystems, o Vantablack é capaz de absorver 99,96% da luz visível. Ou seja, é um material tão escuro que é como se ele fosse invisível aos nossos olhos.

Composto por nanotubos de carbonos que são 10 mil vezes menores que um fio de cabelo, a cor do Vantablack é o que mais se aproxima de um buraco negro. É basicamente o mais perto do preto com ausência total de luminosidade que podemos chegar.

Anish Kapoor, exibição com Vantablack na Kukje Gallery em Seul, Coréia do Sul em 2016 (imagem: Anish Kapoor); 

Inicialmente, o uso do Vantablack teria diversos fins científicos como o uso em telescópios e câmeras espaciais, evitando que a luz indesejada chegasse ao sensor, ou para revestir veículos militares a parte.

Ao ter conhecimento disto, Anish Kapoor se ofereceu para colaborar com a criação do Vantablack e imediatamente reconheceu seu potencial artístico. Por essa colaboração, achou que era natural ter exclusividade sobre a substância, já que vem trabalhando no projeto desde 2014 e ajudando na produção.

A sua ideia era criar formas vazias, exclusivas na arte. Ele explica sua vontade de trabalhar com a cor: “Talvez o preto mais escuro seja o preto que carregamos dentro de nós mesmos”, diz ele. 

“Não é a noite onde você desliga as luzes – é a noite onde você fecha os olhos. Há um lado psicótico para a escuridão que não associamos facilmente a outras cores. Eu suspeito que o vermelho faz o mesmo. Eu trabalhei muito com vermelho também, por razões não diferentes”. 

Acima, o Black 2.0 criado por Stuart Semple e disponível para qualquer pessoa que queira comprar no mundo (menos Anish Kapoor). Obra (unicórnio) criada por Stuart Semple com o pigmento.

A briga pelo preto mais preto ainda não acabou

A Vantablack diz estar trabalhando no Vantablack 2.0, um novo material que inibe a luz mais ainda e distorce a realidade. Quando um laser é voltado para a superfície, ele desaparece completamente, como se nenhuma luz estivesse tocando.

A primeira escultura é polida e dourada, com uma sobrancelha pesada e nariz protuberante. Ao ser revestida com Vantablack 2.0, embora idêntica na forma, aparece como um espaço preto totalmente vazio. 

Enquanto isso, artistas do mundo todo testam em suas criações o Black 2.0 e compartilham o poder da tinta pelas redes sociais com a hashtag #ShareTheBlack, desafiando Kapoor.

De qualquer maneira, que tal acompanhar a saga e o trabalho de ambos os artistas no Instagram? Anish Kapoor – Instagram e Stuart Semple – Instagram.

Via.

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