Noite Estrelada sobre o Ródano
Noite Estrelada sobre o Ródano
Art Attack

A história fascinante por trás da obra “Noite estrelada” de Van Gogh

Durante sua carreira, o pós-impressionista Vincent Van Gogh pintou vários temas. Quem conhece um pouco de seu trabalho sabe que ele frequentemente tinha como objeto de estudo representações da natureza-morta, floresautorretratos e pinturas noturnas reluzentes, incluindo Noite Estrelada sobre o Ródano, uma obra concluída em 1888, que traz uma paisagem vista à noite à beira do Ródano, um importante rio europeu.

Como muitas de suas pinturas mais famosas, Noite Estrelada sobre o Ródano foi pintado após a sua mudança para Arles, no sul da França. Embora esta peça não seja tão conhecida como a turbulenta Noite Estrelada que o artista completaria mais tarde, ela continua sendo uma parte importante de seu portfólio; além de ilustrar sua abordagem nunca antes vista para pintar “efeitos noturnos”, o quadro captura um raro momento de calma nos caóticos anos finais de sua vida.

O quadro de Van Gogh foi pintado nas margens do Rio Ródano, o que lhe permitiu captar os reflexos da iluminação a gás na cidade de Arles e as águas azuis cintilantes. O céu é iluminado pela constelação da Ursa Maior e em primeiro plano, dois amantes passeiam nas margens do rio, sobre a areia.

A VIDA DE VAN GOGH

Em 1853, Van Gogh nascia na Holanda. Embora tenha expressado interesse em arte quando criança, ele seguiu várias carreiras diferentes antes de considerar seriamente a arte como seu trabalho em tempo integral aos 27 anos. Depois de não ver nenhum sucesso artístico na Holanda, decidiu se juntar ao seu irmão negociante de arte Theo, em Paris em 1886.

Infelizmente, o tempo de Van Gogh na capital francesa foi sem muito sucesso. “Parece-me quase impossível poder trabalhar em Paris, a menos que você tenha um refúgio onde se recuperar e recuperar sua paz de espírito e autocontrole”, escreveu em uma carta a Theo em 1888. “Sem isso, você ficaria totalmente entorpecido.” Em busca dessa “paz de espírito”, Van Gogh foi para o sul, pousando na pequena comuna de Arles.

Van Gogh chegou a Arles cansado da intensa vida parisiense, onde as naturezas-mortas florais eram muito apreciadas, e começou a pintá-las com a intenção de vendê-las. Aqui, ele criava uma de suas grandes obras, o Girassol. Ali, ele desenvolveria cada vez mais seu estilo próprio, caracterizado por uma paleta de cores vivas e pinceladas expressivas. Essa abordagem é cada vez mais evidente em todo o seu trabalho concluído em 1888, incluindo também Quarto em Arles e Terraço do Café à Noite.

NOITE ESTRELADA SOBRE O RÓDANO

Assim, pintou Noite Estrelada sobre o Ródano a partir da margem do rio, que atravessa a Europa. Este local provou ser ideal para o artista, pois ele estava cada vez mais interessado nos efeitos da luz – particularmente, na iluminação artificial das lâmpadas a gás – à noite. Para mostrar então o movimento dos reflexos cintilantes delas e das estrelas, ele então usou suas pinceladas enérgicas que refletem na água do rio.

Ao pintar esta obra, no entanto, não eram as pinceladas que preocupavam o artista; eram as cores. Van Gogh explica sua atenção aos tons em uma carta a Theo. “O céu é azul verde, a água é azul real e o chão é malva. A cidade é azul e violeta e a luz do lampião é amarela com reflexos dourados, descendo até o bronze esverdeado. Sobre o campo azul esverdeado do céu a ursa maior tem uma cintilação verde rosa, cuja palidez discreta contrasta com o dourado do brutal lampião.”

Van Gogh, Arles, setembro de 1888. Uma das grandes obsessões de Van Gogh era retratar a noite e a natureza que encontrava. O quadro atualmente está no Museu de Orsay em Paris

Cheio de energia vibrante, a cena é calma; as únicas pessoas presentes na composição são duas figuras de namorados em primeiro plano e, apesar de estrelas cintilantes, o céu provoca uma sensação de tranquilidade. É justamente essa atmosfera que diferencia esta primeira tela de Noite Estrelada sobre o Ródano de sua versão mais famosa, a Noite Estrelada.

Em Arles ele foi em busca de luz e cor para suas obras. Mas foi justamente durante este período que se tornava cada vez pior devido sua doença mental. Suas telas, no entanto, ainda não revelavam sua turbulência interna, como ele mostra na serena Noite estrelada sobre o Ródano. O artista chegou a dizer que estava “terrivelmente fascinado pelo problema de pintar cenas ou efeitos noturnos no local, ou melhor, à noite.”

O artista chegou a escrever ao seu irmão dizendo que se seus quadros tivessem todos esta calma, haveria público para as suas obras. Após um colapso nervoso e um confronto emocional com o colega artista Paul Gauguin, Van Gogh cortou parte de sua própria orelha. Na manhã seguinte, foi internado em um hospital, recebendo alta alguns dias depois. Ao perceber a gravidade de seus problemas mentais, optou por deixar Arles e se internar em um estabelecimento de saúde mental nas proximidades de Saint-Rémy-de-Provence.

NOITE ESTRELADA: TEMPO DE ASILO, TEMPOS DE TURBULÊNCIA

Durante sua estada no asilo, Van Gogh adotou uma sala extra como estúdio e concluiu 150 pinturas, incluindo a famosa A Noite Estrelada, uma obra pintada de forma totalmente diferente e através da “janela com barras de ferro” de seu quarto.

Com apenas alguns meses de diferença, os dois quadros são surpreendentemente semelhantes em estilo e assunto. No entanto, há uma divergência em suas cores, já que, na pintura posterior, “a violência de sua psique perturbada é totalmente expressa”, como mostra o Musée d’Orsay, em Paris, França, local onde a primeira obra (Noite estrelada sobre o Ródano) está exposta atualmente. A segunda (Noite Estrelada) fica no MoMa em Nova York.

Van Gogh, Saint-Rémy-de-Provence, Junho de 1889. O quadro está no MoMA, 5º andar, 501.

O FINAL

Em 27 de julho de 1890, pouco mais de um ano depois de concluir A Noite Estrelada, Van Gogh faleceu. Embora menos famosa do que a versão posterior, Noite Estrelada sobre o Ródano ainda é considerada uma das maiores obras-primas do artista. O que torna este trabalho ainda mais especial é o significado que ele teve para o artista.

Observando que as noites em Arles eram “ainda mais ricamente coloridas do que o dia”, ele ficou obcecado com a ideia de reproduzir o céu estrelado do sul da França. Era um artista que não desprezava os modelos nem a realidade dos fenômenos, e assim conseguiu transparecer todas as suas emoções através da arte.

“Uma vez fui dar um passeio pela praia deserta, à noite. Não foi alegre, nem triste – foi belo.” – Van Gogh