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Bem-vindo à Macalândia

 

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“Cuidado! Há um morcego na porta principal. Cuidado! Há um abismo na porta principal.” O refrão de Gothan City, uma das músicas mais conhecidas do compositor carioca Jards Macalé, em vez de repelir, deve sim atrair quem tiver um tempinho e passar nos próximos dias pelo Itaú Cultural, em São Paulo.

Você nem precisa conhecer muito sobre ele – como, confesso, acabrunhado, ser o meu caso – mas ao se deparar com a ‘Macalândia’, ‘ocupação artística’ genialmente projetada pelo quadrinista Lourenço Mutarelli, você vira fã do cara em questão de segundos!

Já quero ouvir tudo, ler tudo e assistir tudo o que diga respeito ao sujeito que, felizmente, ainda está vivo – sim essa antologia não é mais uma aula de história! Mas, vamos lá, quem é o Macalé? Resumindo: atuou e fez trilha sonora em filme de Nelson Pereira dos Santos. Compôs para exibições de Helio Oiticica, Xico Chaves e Lygia Clark. Dirigiu Maria Bethânia e Gal Costa. Foi parceiro de Waly Salomão, Vinicius de Moraes e José Carlos Capinam. Produziu “Transa” (1972), obra-prima do período de Caetano Veloso no exílio, em Londres. Ufa! De tudo, o cara fez um pouco.

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Ah, quase ia me esquecendo, Jards Macalé é um anarquista convicto. Na mostra, por exemplo, você poderá ver fotos e recortes de jornais de casos emblemáticos que revelam seu posicionamento político. Alguns relatam a prisão do cantor por incluir um número não combinado com os censores em um show com Moreira da Silva. Outros revelam a tensão, em dezembro de 1973, quando ele organizou o show O Banquete dos Mendigos, com Raul Seixas, Dominguinhos, Chico Buarque, Johnny Alf, Gal Costa e outros para celebrar – em plena ditadura militar – os 25 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos.

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A mostra reúne um vasto acervo de cartas, revistas, objetos pessoais, cartazes de shows, trechos de produções para cinema e filmes caseiros – com direito a uma sala secreta, telefones públicos com mensagens gravadas e um banheiro digno de um pé sujo nos seus melhores dias!

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A ‘ocupação’ conta ainda com uma trilha sonora ambiente que mescla a musicografia de Macalé com canções que ele ouve no seu dia a dia – sambinhas eternos!

Lá você vai descobrir que Macalé adora HQs, é apaixonado por pipas, é fã do Super Homem e de São Jorge e defende o lema “Amor, Ordem e Progresso” para a bandeira nacional. “Seria a primeira bandeira do mundo onde estaria inscrita a palavra amor”

Na saída da Macalândia, você passa por um chuveiro onde, ao som de Juízo Final de Nelson Cavaquinho, toma um banho sem água – “O sol….há de brilhar mais uma vez/A luz….há de chegar aos corações/Do mal….será queimada a semente/O amor…será eterno novamente…” É uma espécie de benção para continuar o dia leve e na paz de Macalé. A propósito, lembrei nessa hora de uma frase/conselho que dizem que o cineasta Glauber Rocha costumava usar para se despedir dos outros: “Não diga que me viu, para a sua segurança pessoal”.

SERVIÇO

Ocupação Jards Macalé: no Itaú Cultural, em cartaz até o dia 6 de julho. De terça-feira a sexta-feira, das 9h às 20h e aos sábados, domingos e feriados, das 11h às 20h. Entrada franca. Classificação indicativa: Livre