A Cris Corrêa é uma daquelas pessoas que não se deixa abalar. Aos 17 anos, ela sofreu um acidente de carro e desde então é cadeirante. Isso nunca a impediu de seguir em frente, muito pelo contrário. Cris diz que sua vida é sem drama, exatamente como a de todo mundo: com uma mistura de capacidades e limitações. Mas, mais do que isso, hoje a gente vem apresentar o seu lindo trabalho com toy art.
A menina que desde criança gosta de artesanato, após o acidente, começou a se dedicar com mais certeza à sua paixão. Se formou em pedagogia e desenvolveu um projeto que falava sobre cidadania através do teatro de bonecos. Foi aí que essa nova habilidade a levou para o mundo Toy Art. Ela conheceu os bonecos pela internet e pensou que isso seria a sua forma autêntica de expressar arte. Foi quando começou a criar “monstrinhos” e personagens bizarros.
O primeiro toy que fez foi rejeitado pela maioria por ser ‘’macabro’’ demais, e a expressão ao vê-lo foi unânime: “Oh Maenga!” – que em sua região (interior de São Paulo) é usada como interjeição de pena/dó. Mas isso não a desanimou. Cris ficou ainda mais motivada, continuou em frente e hoje possui a Maenga Toys, marca que desenvolve vários trabalhos com design exclusivo, desenhados e confeccionados por ela.
Conversamos com a Cris para saber um pouco mais da sua história. Dá só uma olhada que bacana:
FTC: Como e por que a Maenga Toys surgiu?
Cris: O porque de tudo está sem dúvidas diretamente relacionado aos meus gostos pessoais. Desde a minha infância tenho admiração por um ”universo estranho”, monstros, personagens bizarros, assim como pelas artes. Acabei tendo mais contato com a arte no período de readaptação que passei após um acidente de carro que sofri aos 17 anos. Entrei em contato com várias técnicas artesanais, e paralelo a isso me envolvi com trabalhos de educação cristã de crianças, musicalização infantil, o que me levou a cursar Pedagogia.
Descobri a toy art por conta de um trabalho de faculdade que estava desenvolvendo. Em 2008 logo surgiu a ideia de começar a me arriscar na fabricação de bonecos. De início só estava tentando expressar ideias, fabricar meus próprios bonecos e monstros. Sempre tive muita dificuldade pra encontrar esse tipo de produto para comprar, sempre curti pelúcia, mas a maioria é sempre muito “normal”.
Quem acompanha meu trabalho já sabe a origem do nome ”maenga toys”, mas faço questão de repetir a história de como o primeiro toy que fiz foi rejeitado pela maioria por ser ‘’macabrinho’’ e feio demais. Não sabia costurar direito, o pouco que sabia era feito 100% handmade e com nenhuma qualidade. Por conta disso, a expressão ao vê-lo foi unânime: “Oh Maenga!”, que na minha região é usada como interjeição de pena ou dó. Realmente era de dar dó de tão mal feito. Gosto de citar isso, pois não me desanimou, pelo contrário! Achei super engraçado, me motivou ainda mais a criar e principalmente a me aperfeiçoar pra começar a fazer não apenas pra mim, mas pra galera que também curte monstros. Mas isso não aconteceu do dia pra noite, considero que a partir de 2010 apresentei uma melhora significativa no meu trabalho.
Foi nesse cenário que a Maenga Toys nasceu, meio na brincadeira e sem muita pretensão. Aos poucos meu trabalho foi ganhando espaço no mundo craft e admiradores da toy art foram chegando.
FTC: De onde vem a sua inspiração?
Cris: Tudo que eu vejo, principalmente a própria natureza, me inspira muito. É impressionante a diversidade de cores e formas que podemos encontrar na natureza: existem plantas, animais inimagináveis, super bizarros, fantásticos. O mundo é uma explosão de criatividade. O ser humano em si é extremamente curioso. Também me inspiro nas pessoas, todos nós somos um pouco monstro, no bom sentido (ou não).
Falando de referência artística, sou apaixonada pelo mundo de Tim Burton, que é minha maior influência, O filme Beetlejuice foi um divisor de águas na minha infância. Tinha o costume de desenhar pessoas com cabeça de monstro, mas sempre recebia incentivo pra tentar desenhar pessoas ”normais”. Parei de desenhar por um período por não conseguir desenhar diferente do que estava acostumada, até assistir o clássico traduzido como ”Os Fantasmas se Divertem”. Em uma das cenas, o casal Maitland aparece com cabeças de monstros, me recordo como se fosse hoje de como me senti: chamei minha mãe pra ela ver que eu não estava sozinha na ideia de humanos com cabeça de monstros. Desde então admiro suas obras.
Artistas que passei acompanhar hoje em dia também são importantes para mim como: Travis Louie’s, Benjamin Lacombe, Kill Taupe, Mark Ryden entre outros.
FTC: Como as cores influenciam no seu dia a dia?
Cris: Há quem veja a vida incolor, mas tudo que vejo são cores! Sou apaixonada pelas cores, elas têm o poder de fazer os nossos olhos sorrirem.
Por conta do acidente que sofri, tive uma lesão medular e por consequência me tornei cadeirante. Muita gente passou a conhecer esse ”detalhe” da minha vida no início desse ano. Após 3 anos de Maenga Toys, mesmo já tendo dado várias entrevistas, só agora tive uma boa abertura pra expor isso. Todas as vezes que fui procurada pra falar sobre a toy art plush, as perguntas sempre foram direcionadas ao meu trabalho, e não havia necessidade de falar sobre algo que é tão comum que se torna normal.
Como meu objetivo sempre foi ser reconhecida pela minha arte, esperei pelo momento certo, que chegou recentemente com a oportunidade de firmar parceria com a Singer. Dei uma entrevista para o blog Minha Singer falando um pouco mais sobre mim. De lá pra cá, algumas pessoas passaram a prestar mais atenção nisso, o que é bom, pois tenho o prazer de dividir a ideia de que a vida é multicor. Isso significa que tanto os tons mais escuros e sombrios, como as cores vivas e alegres fazem parte dela: cabe a nós aprender admirá-los e reconhecer a beleza de cada um.
Desisti de ficar deprimida logo nos primeiros meses após o acidente. Eu até tentei me deprimir, mas não tive paciência de viver me lamentando por algo que já havia perdido. Logo, comecei a prestar mais atenção no que de fato importa na vida. Enxergar por um novo ângulo me fez me perceber de uma forma mais consciente, e por consequência perceber os outros também. A realidade é que todos nós somos dotados de capacidades e limitações, as diferenças prevalecem.
A cadeira de rodas é vista como algo que limita apenas por quem não precisa dela pra se locomover. Pra estes, ela se apresenta sem cor, mas, para quem precisa dela, é multicor, pois é um instrumento de liberdade. É um contraste interessante pra refletir, a diversidade das cores pode nos ensinar a importância de colorir a vida. Na verdade, é só pegar um pincel e começar…
No vídeo a Cris fala um pouco mais sobre como começou o seu trabalho:
No Facebook: Maenga Toys.