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Dos livros infantis à tatuagem: nos traços de Bruna Barros estão mulheres, natureza e pequenos detalhes da vida

Mulheres, animais, plantas, flores e os pequenos detalhes da vida ilustrados de maneira peculiar. De uma sensibilidade sem igual, Bruna Barros utiliza o desenho como ferramenta principal para se comunicar. Foi depois de largar o design de ambientes e escritórios de arquitetura que decidiu seguir firme no propósito de se tornar uma ilustradora de livros infantis.

Começou a estudar muito, se concentrou em amadurecer a sua própria linguagem e o domínio das técnicas. Só depois de alguns anos (e claro, de muito ‘chororô’, segundo a artista) que as coisas rolaram. Hoje, ela já possui 8 livros publicados em 7 línguas diferentes.

Em 2017, a vontade de tirar o desenho do papel foi crescendo cada vez mais, e Bruna então pensou em testar novos materiais. A ideia inicial era se enveredar pelo mundo da cerâmica. Ela iniciou a prática no atelier de uma amiga e ali conheceu uma ceramista e tatuadora incrível, Aline Wata.

“Eu já tinha tido curiosidade sobre a tatuagem, mas era um mundo totalmente desconhecido por mim e a Aline me abriu as portas, me ajudou a começar e eu me apaixonei imediatamente. Vi na tatuagem uma nova forma de aplicar o desenho”. 

Depois disso, não parou mais.

“Amo fazer livros e continuo investindo nessa carreira, mas recentemente percebi que não precisava me restringir a isso, já que as possibilidades de aplicação do desenho são infinitas. E o infinito para mim é uma ideia fascinante!”

Hoje, em São Paulo, a criança que adorava desenhar menininhas em fileiras com a tia, transformou a sua maneira de enxergar o mundo em uma arte única.

Conversamos com Bruna Barros para saber um pouco mais sobre suas inspirações. Confira entrevista exclusiva ao FTC:

FTC: Bruna, como você define a sua arte/estilo? 

Por muitos anos sofri por não ter claro para mim o meu estilo. Achava que somente nesse momento eu iria conseguir me dizer ilustradora. Vejo o portfólio de muita gente e fico maravilhada, uma paleta de cores bem definida, uma linguagem coerente que permeia toda a produção. Mas nunca vi isso em mim, e ainda hoje olho para os meus trabalhos e vejo um emaranhado de coisas diferentes.

Por muito tempo tive vontade de começar do zero todos os dias ou criar pseudônimos para atribuir a cada um uma estética. No entanto, tenho achado que talvez isso não tenha assim tanta importância. Para mim o importante é me reinventar, inaugurar fases novas, me inspirar em ventos diferentes. Fico pensando que talvez um estilo hermético pudesse me sufocar. Espero que isso não aconteça.

FTC: Com o que você se inspira? 

Gosto muito da arte antiga, das esculturas medievais, da bidimensionalidade da arte do oriente médio, de ornamentos e tecidos tradicionais. Gosto de me inspirar nos sentimentos do quotidiano, e na profundidade das miudezas esquecidas. Atualmente tenho como fortes referências as formas da natureza, acredito que tenho muito o que aprender com ela.

FTC: Qual foi sua primeira tatuagem em um cliente?

A primeira tatuagem que fiz foi na Betina, uma amiga cantora que hoje também está tatuando. Ela se candidatou a ser minha cobaia e fizemos de cara duas; uma mariposa e uma menina de maiô pulando em uma xícara de café.

FTC: Mulheres, animais, plantas e flores. Pode falar mais sobre esses temas que sempre aparecem em sua arte?

Os animais ainda estão chegando! Apareceram alguns por aí, mas é um território bem desconhecido para mim, ainda estou começando a estudá-los. As plantas e flores, como eu disse antes, são parte desse processo de perceber a natureza e de aprender com ela.

Acho a gente acha que sabe demais, mas me basta pegar uma folha na mão para me fazer ver o quanto a realidade vai muito mais além. Existe ali um intrincado universo de veios, ritmos e cores que nem nos damos conta.

as mulheres, é interessante ter voltado a elas com tanta intensidade assim, justo agora. Quando eu era criança, a minha tia me colocava no colo, abria um caderno e com uma caneta bic começava a desenhar uma fileira de menininhas. Enquanto desenhava íamos criando histórias, eu pedia para colocar uma roupa, adicionar um cachorrinho, uma filhinha, foi assim que aprendi a desenhar. Nos 15 ou mais que se seguiram, foi basicamente o que eu desenhei, meninas. Desenhava os modelos para a minha mãe costurar e achava que um dia eu seria designer de modas. Mas depois parei.

Vi que precisava aprender outras coisas do mundo. Em 2015, quando morava em Istanbul comecei um projeto que trouxe de volta todo esse universo feminino. Intrigada pela ideia que temos da cultura muçulmana como uma cultura machista e repressora comecei a observar as mulheres que encontrava no transporte público. Queria tentar captar o que havia por detrás dos véus e burcas, queria entender com o que sonhavam e até que ponto elas se sentiam reprimidas. Obviamente não cheguei a resposta nenhuma. Além das 10 gravuras que se seguiram à essa pesquisa, ficou o vício de observar as pessoas e de tentar captar esse feminino.

FTC: Está tocando algum projeto especial ou específico atualmente?

Estou desenvolvendo junto com uma amiga, que é terapeuta corporal, um projeto de pôsteres instigando as mulheres a conhecerem mais o seu corpo. Estamos fazendo em serigrafia, com as minhas meninas de maiô, e está ficando bem legal.

Além disso, ilustrações para o encarte de um CD infantil de uma banda de Minas Gerais. Também tenho vários projetos pessoais, um deles é desenhar folhas, que por falta de tempo está bem parado, mas pretendo retomar em breve.

FTC: O que tem lido, ouvido, visto, quais são os artista preferidos no momento?

Ai, pergunta difícil. Como sempre, tenho lido muito menos do que gostaria, mas tem dois livros que estou devagar e que tem mexido bastante comigo; “Walkscapes, o caminhar como prática estética” de Francesco Careri e “O maravilhoso e o quotidiano no ocidente medieval” de Jacques Le Goff.

Há alguns meses me apaixonei pela música de “Lhasa de Sela”, cantora tão maravilhosa, que não sei porque fui conhecer só agora. Também tenho escutado repetidamente o disco “In the Heart of the moon” de Ali Farka Touré.

Já de filme, me deu vontade de conhecer melhor os super clássicos que nunca tinha visto, então na semana retrasada vi todos da série do Planeta dos Macacos e agora não sei, estou com vontade de continuar nesse terreno por mais um pouco.

Também adoro documentários e tem um que particularmente me tocou nessa semana “Migração Alada”, eu fico fascinada com essa história de pássaros que atravessam continentes quando mudam as estações.

FTC: E agora, o que vem pela frente?

Para as tatuagens quero rever um tema que estudei muito durante o meu mestrado, que é uma mistura interessantíssima de mitologia, astrologia, plantas e animais que figuravam a escultura marginal medieval. Ali tem uma fonte inesgotável de inspiração! Também quero me aprofundar na temática dos pássaros e começar a mesclar as meninas com formas mais orgânicas.

Também tenho alguns livros esboçados que pretendo (e irei) finalizar no próximo semestre. E claro, fora tudo isso que estou planejando e sonhando, tenho ainda a certeza de que muitos encontros virão e a vida ainda vai trazer muita inspiração boa!

Bruna Barros é apaixonada por ilustração, tatuagem, cerâmica, pela natureza, por observar e captar a alma feminina. 

Acompanhe o lindo trabalho da ilustradora e tatuadora Bruna Barros em seu site e Instagram.

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