Nenhum lugar melhor no mundo para se disfarçar do que a cidade dos canais: Veneza. Máscaras de todas as formas, cores e tamanhos tomam conta de cada esquina, mantendo uma tradição de mais de mil anos, que é quando se tem notícia dos festejos dos primeiros carnavais. Não faltam opções de alegorias de arlequins, colombinas, pierrots e pantaleões – os célebres personagens da Commedia dell’Arte –, porém um detalhe chama a atenção nessa abundância toda: 99% dos artigos disponíveis contam com a discreta inscrição ‘Made in China’.
A breve anedota – mais uma das tantas relacionadas ao processo que dizem por aí que se chama globalização – contada logo no início da nossa visita ao Atelier de las Máscaras por Carlos Alberto Gaudin, mostra o quão valioso é o trabalho que se desenvolve ali. O atelier, localizado a cerca de 20 quilômetros do centro da cidade de São Francisco Xavier, em São Paulo, é o único das Américas especializado na técnica de cartapesta para a produção de máscaras, um processo de empapelamento complexo capaz de gerar artigos exclusivos com a qualidade que remonta a dos maschereri de outrora.
Argentino radicado no Brasil há 40 anos, Gaudin conta que começou a se interessar por máscaras venezianas por necessidade e inspiração. “Era executivo de marketing, tinha 49 anos, mas estava desempregado há dois, sem perspectiva de recolocação no mercado. A inspiração veio ao visitar um amigo da minha atual esposa. A mulher dele tem uma parede cheia de máscaras venezianas em seu apartamento no Rio”.
Das suas mãos saem hoje, além dos personagens clássicos da Commedia dell’Arte, o famoso gatto veneziano, a máscara do Fantasma da Ópera, a bauta, que aparece no filme “De Olhos Bem Fechados”, de Stanley Kubrick, e até mesmo a mítica máscara de Guy Fawkes, símbolo dos manifestantes do grupo Anonymous. Curioso ouvir da boca de Gaudin a história de cada uma das peças que ele produz ali e provar as máscaras, posar para fotos e, literalmente, viajar no tempo.
Mais curioso ainda ver ali, no meio de uma estrada de terra sinuosa cercada de mato de todos os lados, o símbolo da resistência de uma arte por si só tão ligada ao mistério, à sedução e ao ato de se esconder. Assim de pertinho, soa bastante revelador, não acha?