Durante os meses de setembro e outubro de 2016, os artistas brasileiros OSGEMEOS fizeram uma exposição em Nova York prestando uma homenagem a música. A mostra “Silence of the Music” ocupou a Galeria Lehmann Maupin, no Chelsea, com mais de mil pessoas presentes na abertura.
Com a proposta de oferecer uma experiência multissensorial, a mostra ocupou as cinco salas da galeria, cada uma com um tema e uma seleção única de pinturas e objetos que iam do chão ao teto. As obras não seguiram um padrão único: havia grafites nas paredes e em quadros, esculturas e colagens. E como era de se esperar pelo título da exposição, ouvia-se música em todos os ambientes.
Logo na entrada, diversas telas com a estética já conhecida dos artistas, com seus personagens amarelos e várias referências à cultura brasileira. É interessante reparar nos detalhes e nas expressões e frases espalhadas nas paredes, como “porque é que seus medo dói” (sic) e “pavão misterioso”.
Em outra sala, o tema musical ficava mais evidente, com obras dedicadas a cultura hip hop, com ícones como o bboy Ken Swift, uma colaboração com o artista Doze Green a partir de uma imagem de Martha Cooper, que ficou célebre por fotografar a cena de graffiti de Nova York dos anos 70 e 80. Na mostra, boomboxes amarelas com alto-falantes embutidos simulavam uma mesa de um DJ.
A outra área, mais lúdica, chamava a atenção por uma escultura de um dos personagens girando ao lado de uma imagem da lua, como se estivesse orbitando. A cor predominante ali era o azul, fazendo contraponto aos tons quentes da sala ao lado, uma referência ao sol.
Nesse segundo ambiente, ficava a escultura “O Beijo”: uma máquina musical com suas engrenagens expostas, duas faces de cada lado e, acima dela, um rosto iluminado.
Ver tantas referências ao hip hop estando em Nova York eleva a experiência a outro nível, já que foi na cidade onde essa cultura teve início. Mas é importante lembrar que OSGEMEOS fizeram parte da origem do movimento em São Paulo.
Nascidos e criados no bairro Cambuci, eles freqüentavam os encontros na estação de metrô São Bento, junto com outros bboys para dançar break. A cultura da rua nunca deixou de fazer parte do trabalho dos irmãos, que mesmo expondo em galerias e museus em todo o mundo, continuam grafitando prédios e se arriscando pelos muros.
Veja abaixo a entrevista exclusiva que eles deram ao FTC sobre a exposição “Silence of the Music” e sobre seu processo criativo:
FTC: Qual foi a maior inovação que vocês fizeram na exposição “Silence of the music”? É a experiência sensorial ou tem algum outro elemento novo que vocês exploraram dessa vez?
OSGEMEOS: Sempre tentamos nos superar em nossas expectativas. É uma exposição nova, com obras novas, mas nesta exposição específica exploramos mais nosso lado musical. Sempre tivemos muita ligação com música e acho que naturalmente trouxemos isso de volta.
FTC: Vocês ouvem música quando estão criando suas obras? Se sim, vocês lembram ou poderiam citar exemplos do que ouviram para trabalhar no “Silence of the Music”?
OSGEMEOS: Escutamos música sempre! E tudo pode se tornar música: o barulho das ferramentas, o som da noite, o som do dia… Temos uma playlist gigantesca que nos acompanha, que vai desde ópera até old School electrofunk. Nesta expo específica tínhamos uma sala dedicada ao hip hop oldschool! E fizemos uma playlist toda voltada a isso.
FTC: O que muda no processo criativo de vocês quando vocês expõem obras em galerias e museus, ao invés de grafitar na rua?
OSGEMEOS: O processo criativo não para. Estamos em constante processo de criação! A rua tem sua magia… O que faz a rua ser tão especial é que já existe toda uma atmosfera, um clima, pessoas, situações de risco, situações inusitadas, e muitas surpresas.
Isso faz com que nosso trabalho na rua dialogue diferente de uma expo em uma galeria ou museu, onde nós criamos essa atmosfera dentro de uma sala branca e abrimos um portal para nosso universo paralelo.
FTC: Quando vocês fazem trabalhos no exterior, vocês tentam inserir mais elementos da cultura do lugar em questão, procuram algo mais universal ou tentam mostrar os aspectos brasileiros? Ou vocês seguem um tema independente do lugar?
OSGEMEOS: Estamos sempre procurando novas influências. Temos essa bagagem de sermos brasileiros e amamos nossa cultura, temos influência de nossa cultura, ao mesmo tempo somos muitos abertos a influências e aprendemos a filtrar bem.
Tudo nos influencia, o dia a dia é uma grande influência. Achamos muito importante essa troca de influências, quando chegamos em um lugar que não conhecemos e trocamos, aprendemos com o lugar, as pessoas e as coisas que vemos.
FTC: Qual a principal diferença no público brasileiro e o de Nova York? Vocês sentem mais receptividade nos EUA do que no Brasil?
OSGEMEOS: A arte toca as pessoas. Você só tem que estar aberto pra isso, independente de que lugar você vem. É a sensibilidade, não tem fronteiras nem regras, é atemporal e quando você coloca 100% de energia positiva e verdadeira em algo, acreditamos que é muito natural as pessoas se identificarem.
NY tem uma escola de graffiti desde os anos 70, eles já estão mais acostumados a valorizar artistas que vem deste universo, em NY sentimos que galeristas e diretores de museus são ousados, acho que pelo fato de esta forma de arte ter nascido e crescido lá.
No Brasil tem muita coisa acontecendo, muitos colecionadores, galeristas, diretores de museus que tem valorizado novos artistas. Acho que pela força que a rua tem e também pelo fato de as novas gerações estarem buscando coisas novas.
Tudo hoje em dia acontece mais rápido, depois da internet tudo mudou, acho importante valorizar artistas novos, acho que pelo fato de termos muitos motivos a criar e fazer arte, somos um país muito criativo, é muita coisa boa para exportar. Hoje trabalhamos com a galeria Lehmann Maupin, e no Brasil, a Fortes Vilaça.
“Porque é que seus medo doi?”
Fotos © Débora Costa e Silva.