Paula Schlindwein nasceu no interior de Santa Catarina, na cidade de Urussanga, mas mora em Florianópolis há mais de vinte anos. Cresceu em meio aos desenhos, linhas e emoções. Foi uma criança tímida, sensível e muito observadora. Depois disso, veio a faculdade. Paula se formou em Biblioteconomia e não via perspectiva, pois não era bem o que queria para a sua vida. Foi quando tomou coragem, largou o emprego fixo e se entregou ao universo da arte de corpo e alma.
Artista autodidata, Paula vem atuando na área desde então e no momento faz especialização em Arte e Educação. A paixão pela figura humana, particularmente por retratos femininos, existe desde o início de seu trabalho. Elas unem a necessidade psíquico-física de expressar seus sentimentos e reflexões a respeito do mundo particular e coletivo. Seu estilo peculiar faz com que cada uma de suas obras tenham uma elaboração especial.
“A auto-representação do meu corpo e das minhas memórias foi um meio que encontrei para abordar a dor de traumas e experiências do cotidiano, situações e pensamentos que todos nós temos, e observar a relação do entorno físico e emocional, expressando-me através da arte, na tentativa de ressignificar e construir minha identidade e a relação com o outro”. Entre aquarelas, bordados, papel, telas e muito talento, Paula Schlindwein cria poesia feminina sem precisar usar nenhuma palavra. Suas linhas e desenhos flutuam.
Confira entrevista exclusiva que fizemos com a artista e conheça um pouco mais de seu sensível trabalho!
FTC ENTREVISTA PAULA SCHLINDWEIN
FTC: Paula, quais materiais você mais utiliza e qual deles mais sente prazer em trabalhar?
Adoro a intensidade, a transparência das cores, as possibilidades cromáticas, e a inconstância da aquarela (já que envolve o protagonismo da água que é um elemento de difícil manuseio), além da textura e a força do bordado, que juntos dão às obras um tom de profundidade e um misto de mistério, vulnerabilidade e força.
Também utilizo o tingimento natural, ecoprint, nanquim, guache, tinta acrílica, entre outros. Gosto de experimentar diferentes materiais e técnicas, mesclar e explorar as potencialidades de cada um.
Paula Schlindwein
FTC: O feminino, o amor, sonhos, o artesanal, experimentações. Como esses temas se relacionam em seu trabalho?
Eu crio e recrio a minha própria história, que é também a histórias de todas as mulheres. Vagueio entre memórias e influências externas, usando o simbolismo para mostras aspirações, perdas, limitações, ilusões, mas também o afeto, o sentimento de amor, de pertencimento e de alegria. O bordado tem uma forte relação com esses sentimentos e com as lembranças da minha infância, e da intimidade com a minha mãe, que foi quem me ensinou a bordar.
Recentemente estou em fase de elaboração de um projeto focando em uma nova exposição, além de estar trabalhando com produtos da minha linha visual (almofadas e a coleção de acessórios: “Devir” que fiz em parceria com a Ana Terra Acessórios). Além disso, estou tentando me aventurar mais, experimentando novos materiais e técnicas como o tingimento natural e ecoprint. Também quero utilizar outras formas têxteis. Não sei ao certo onde vou parar, mas estou feliz e isso é o mais importante.
FTC: Há elementos em comum em suas obras. Poderia nos dizer o que deseja expressar?
Muitas vezes, não temos a real noção do quanto somos fortes, de como é possível vencermos batalhas internas que parecem sem solução. Procuro com meu trabalho, empoderar e inspirar outras mulheres a encontrarem-se em suas contradições, sutilezas e belezas da alma feminina.
FTC: O que faz parte da sua subjetividade que acaba se mostrando na sua arte?
Meus trabalhos trazem imagens do subconsciente, enigmas, metáforas e sensações ambíguas, são histórias cheias de simbolismos e memórias que parecem compor fios de um segredo alquímico (como a transformação do ser vivo da concepção ao nascimento, durante as fases da vida e até mesmo para além da morte).
Algumas personagens estão envolvidas por fios e costuras, prontas a se dissolver ou tomar o voo, outras estão presas, enlaçadas, enraizadas… Mas, se um sentimento de mal-estar súbito aparece, não se deixe enganar, tudo pode adquirir um significado positivo ou negativo, a ambiguidade no contraste visual entre luz e sombra e a visceralidade das personagens, se encontram em uma fusão mais íntima.
As protagonistas das minhas obras, às vezes sussurram, outras vezes expurgam, na tentativa de verbalizar seus anseios e dores. Elas vêm de uma trama, rodeadas por símbolos de fertilidade, maternidade e da criação, como a árvore e sua relação com o feminino, (força, proteção e segurança).
No entanto, a dialética entre criação e destruição, incluindo impulso de vida e morte, parece residir nos rostos das personagens, em seus olhos, em suas mãos, e em seus corações arrebatados do peito. Finalmente elas flutuam, arrancadas da terra talvez?
FTC: Qual a influência das cores nas suas criações?
Tenho uma forte relação com as cores, adoro experimentar as possibilidades das paletas e suas nuances, mas escolho-as de forma intuitiva, acredito que refletem com mais verdade os meus sentimentos.
FTC: Com o que você se inspira?
Ser mulher com certeza me inspira. Minhas ilustrações e bordados são produtos diretos do lugar que habito, “o meu corpo”. E meu lugar no mundo enquanto mulher. Algumas vezes a inspiração surge à partir de uma imagem, um sonho, um filme, poesia, música…
Além disso, as memórias afetivas e a busca constante por autoconhecimento, também permeiam meus trabalhos, pois “criar faz parte de quem eu sou. É a materialização dos sentimentos que carrego”.
FTC: Possui referências que considera influências para seus trabalhos?
Sou uma pessoa bastante sensível e com um olhar treinado para encontrar a beleza em todas as coisas, por isso tudo pode ser uma fonte de inspiração. São várias as referências: Louise Bourgeois, Remedios Varo, Leonora Carrington, Ana Mendieta, Francesca Woodman, Jan Saudek, Irina Ionesco, Pina Bausch, Nina Simone, Marina Abramovic, Egon Schiele, Klimt, Ana Teresa Barboza, Arthur Bispo do Rosário… e muitos outros.
FTC: O que é arte para você? Como sente a sua própria arte?
Arte é liberdade. “Você deve ser capaz de se movimentar livremente dentro e fora da sua mente, e isso é ser livre”. Sinto que meu trabalho se desenvolve a cada dia, gosto de experimentar coisas novas e quero que ele tenha não só personalidade, mas voz, que possa acrescentar algo para as pessoas.
O processo muitas vezes é cansativo e frustrante, pois requer tempo e um estado de espírito específico que não consigo explicar, é como um diálogo interno. Mas o resultado sempre me surpreende, é como um grande quebra-cabeça de tudo que sinto e vivencio. Cada obra conta uma pequena história, é uma alegoria.
FTC: Um livro, uma música e um filme que tem feito sentido neste momento.
Sou apaixonada pelo livro “Mulheres que Correm com os Lobos” da Clarissa Pinkola Estés, é meu eterno livro de cabeceira. No momento tenho ouvido: Nina Simone, Billie Holiday, John Coltrane, Jamiroquai, Dave Matthews Band, The Cure, Led Zeppelin, além de música clássica.
O filme que mais fez sentido nos últimos tempos, Cloud Atlas (A Viagem), escrito e dirigido por Lilly e Lana Wachowski e Tom Tykwer.
“Na vida às vezes precisamos passar por grandes batalhas e sair delas, para então renascer. Acho que aprendemos mais com grandes lições. Esse entendimento me tornou uma pessoa mais forte. Aprecio cada vez mais sentimentos como a compaixão e a empatia, o que sinto ainda com maior intensidade, e que não é de forma alguma um sinal de fraqueza”.
Paula Schlindwein
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