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Arinda da Cruz Sobral, a 1ª mulher arquiteta do Brasil

Apesar de 64% dos profissionais registrados no Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU) serem mulheres e da forte presença feminina nas faculdades, a memória das pioneiras neste campo ainda é obscura. Incentivada por suas alunas do curso de História da Arte e Arquitetura, a historiadora Camila Belarmino partiu em busca das primeiras arquitetas brasileiras.

Através de documentos oficiais e jornais da época, ela descobriu 28 mulheres matriculadas entre 1907 e 1938 no 1º curso de arquitetura do país, na Escola Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro (que até a década de 1930 era a única a oferecer no Brasil). Entre elas, Arinda da Cruz Sobral, que iniciou os estudos em 1907, recebeu o título em 1914 e foi a responsável pelo primeiro projeto feito por uma mulher no país: a Capela São Silvestre, finalizada em 1918. Saiba mais:

Arinda da Cruz Sobral, a 1ª arquiteta do Brasil – e talvez da América Latina

Nascida em 1883, Arinda da Cruz Sobral iniciou os estudos na Escola Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro. Na época, Brasil República, o curso da ENBA não era ainda considerado de nível superior, e a arquitetura era malvista por ser associada ao regime monárquico. Além disso, as salas de aula eram essencialmente masculinas e a profissão perdia importância para a engenharia civil.

Apesar de ter recebido seu título em 1914 com aprovação plena, possuir notas máximas, ter participado de exposições e concursos de trabalhos, Arinda, que já era formada pela Escola Normal um ano antes de ingressar na ENBA, não conseguiu trabalhos na área e seguiu a carreira como docente no ensino público, chegando a ser diretora escolar. 

Arinda da Cruz Sobral. Álbum de artistas v. 1, p. 75, 1932. Divisão de Iconografia Fundação Biblioteca Nacional.

A estudante era anunciada pela imprensa da época com louvor. Porém, a formação de uma mulher era apenas uma maneira da instituição se mostrar alinhada aos valores liberais positivistas do novo sistema político e, dessa forma, tentar conquistar algum prestígio.

Capa do jornal O Paiz, periódico de grande circulação na cidade do Rio de Janeiro, registrou o fato de Arinda ser a primeira arquiteta formada pela ENBA, em 16 de dezembro de 1911 – Foto: Cedida pela pesquisadora

“Em architectura, porém, nenhuma senhora se havia matriculado até 1907, quando se matriculou a primeira e única que foi a Exma. Sra. D. Arinda da Cruz Sobral, normalista pela Escola Normal do Distrito Fedral e professora adjunta effectiva de 1a classe no mesmo Districto. (…) Trata-se de uma futura architecta brasileira, a primeira que na especialidade se diplomará no Brazil.

Jornal “O Paiz”

Capela São Silvestre, seu legado

No entanto, Arinda deixou uma obra: a Capela São Silvestre, localizada na Estrada Heitor da Silva Costa, no bairro de Santa Tereza, no Rio de Janeiro, finalizada em 1918. Em 19 de janeiro de 1912, menos de um mês depois da cerimônia de inauguração oficial da obra com o presidente Hermes da Fonseca, na virada do ano, a Capela foi citada no jornal A Imprensa, com menção ao desenho ser de Arinda. Depois disso, a construção em si nunca recebeu o devido crédito, nem mesmo em registros oficiais, conforme narra a pesquisadora.

Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), a Capela continua em uso com missas mensais. Porém, o reconhecimento de Arinda como autora da obra simplesmente foi apagado da história. Foto: Cedida pela pesquisadora

A construção em formato de nicho possui base com pedras locais, fachada e parte posterior convexa revestida de tijolos de ponta diamante. Apesar do edifício ter recebido uma reforma em 2006 e estar localizado em um área tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), sua edificação ainda precisa de reparos.

A Capela São Silvestre continua em uso com missas mensais, pouco conhecida pelas pessoas, inclusive sua autoria. A primeira arquiteta brasileira viveu até 1981 e faleceu os 98 anos.

As primeiras arquitetas do Brasil

A historiadora ainda resgatou as 28 mulheres, que entre 1907 e 1938 estavam matriculadas no 1º curso de Arquitetura do país. Destas, 25 se formaram e atuaram em escritórios particulares, na prefeitura ou acabaram se envolvendo na luta feminista.

As descobertas foram feitas durante o doutorado de Camila em andamento no Instituto de Arquitetura e Urbanismo (IAU) da USP, em São Carlos, A mulher na arquitetura e no urbanismo: trajetórias profissionais entre as décadas de 1910 e 1960 no Rio de Janeiro, orientada pela professora Eulália Negrelos.

Fonte: Cau RJ e Jornal da USP.